Quem vem lá? O que lá vem? Que ser será aquele que ainda vem tão longe, que de real só tem a sombra, nuns traços desenhados na aridez do chão, projectados pelo sol que lhe bate nas costas e que o transforma em sombra.
Sou eu que aqui venho, abram os portões, deixem-me entrar. Venho montado em sonhos de uma terra onde o sol brilhava. Uma terra sem nome, sem mapas, que sem mim já não existe mais. Terra distante que sonhei, nem sei se existiu ou se só a inventei. Mas, a verdade, sei que lá estive, e que enquanto a minha vida por lá se alimentou fui feliz e tive sempre o sol nos meus quatro pontos cardeais. Mas foi expulso porque, mesmo na terra dos sonhos, sonhei demais.Escorraçado vim com a lembrança de uma vida de bonança. E aqui estou eu.
Abram os portões, o Rei dos Sonhos chegou à terra da realidade. E o sol apagou-se, não há mais caminhos que precisem de luz, de calor e de conforto. Nesta terra, a minha real casa, sei os caminhos todos de cor e mesmo no escuro não me perco. Mas tenho frio, tenho frio e medo deste escuro.
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1 comentário:
O início faz-me pensar muito na Mensagem de Fernando Pessoa, nomeadamente a terceira, e última, parte: O Encoberto. Isto, em especial no contraste entre o real e o utópico, e a forma como são conjugados, aqui. A expressão "Que de real só trás a sombra" é, de facto, brilhante no que toca a expressar esse mesmo contraste.
O sujeito que é apresentado como estando desenquadrado, por sonhar demais, até na Terra dos Sonhos, é uma perfeita reflexão daquilo que se passa cá, por dentro de nós.
Da mesma forma, nas últimas frases, que poderiam em poesia ser consideradas a "chave de ouro", o medo mesmo daquilo que nos é conhecido e o frio, será um sentimento comum e frequente naqueles de nós que conhecem, bem demais, a diferença terrível entre o real e o imaginário utópico, o que se complica ainda mais quando nos apercebemos que, de facto, a essência da realidade nos está interdita. É isto, na minha opinião, o que torna ainda mais difícil a compreensão, e encontro com alguém que, como nós, compreenda.
Gosto muito dos temas, estilo de escrita e, em particular, o que revelam sobre a mente do escritor.
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